domingo, 14 de novembro de 2010

Catorze

Décimo quarto andar. Minha mãe sempre quis se hospedar no terraço do hotel, mas como ela nunca dispôe da sorte e a vacância nunca ocorre ela é obrigada a se contentar com o penúltimo andar. O elevador do edifício era muito antigo e pela lentidão nota-se que deve ser de uma liga de metal muito densa e pesada, o que inviabilizava cada vez mais minha ansiedade que já me corroia. Uma súbita sensação de frio na barriga era cada vez mais intensa e eu não tirava da cabeça a idéia de que algo muito bom ocorreria no nosso reencontro. Ao chegar no nono andar um casal entra por engano no elevador. Me perguntam se o mesmo está decendo e eu respondo que não. Os dois se retiram aos beijos e tropeços pois parecia que estavam muito bebados. Logo me passou pela cabeça qual seria a reação que a Luiza teria ao saber que eu iria reencontrar minha mãe. Mas acompanhada dessa ideia veio também a realidade que me dizia que ela jamais conheceria minha mãe. Assim que a sineta indicou a chegada do elevador meu estomago deu um nó, minhas pernas tremiam e eu já começava a ficar com a respiração ofegante. A porta do quarto dela se encontrava entreaberta e tudo indicava que ela assim a deixara para que eu pudessse entrar sem bater. Para evitar o constragimento dei uma leve batidinha:
- Mãe?
A porta se abriu e ela veio de encontro a mim me abraçando. Não deu nem tempo de tentar evitar, minhas lágrimas que já desciam sobre meu rosto incessantemente, assim como as dela. Ficamos abraçados por mais ou menos uns cincos minutos. Aquilo trouxe pra mim um dos melhores sentimentos de minha vida. Todo o amor que ela me passava naquele momento, supria toda a ausência materna que eu senti durante esse tempo longe dela. Foi algo mágico.
- Filho, você já é um homem agora! - ao dizer isso ela fez uma breve pausa e me fitou perguntando - Como soube da minha estadia aqui no país?
- O Papai me disse...
Antes de terminar a frase ela já me soltara do abraço e o condenava.
- O Tadeu não aprende mesmo. No mínimo ele está hospedado na nossa casa também né? Ele nunca se dá ao luxo de se hospedar em um hotel. Não percebe que pode ser um incomodo...
- Ele está no meu apartamento. Pra mim não tem sido um incomodo, a gente mal se fala...
- Você já tem um apartamento! - ela estava incrívelmente empolgada e ao mesmo tempo expressava um leve ar de dúvida - Seu pai me disse que você morava na nossa casa com uma garota que você conheceu no colégio. De onde você está tirando dinheiro para bancar isso?
- Mãe, agora começa a fazer sentido. O pilantra do Papai omitiu tudo, tanto de mim, quanto de você. Você não deve nem fazer idéia de que me formei e que mês passado eu assumi a edição da Postagem Diária né?
Os olhos delas brilhavam e por ele escorriam uma torrente de lágrimas. Eu sempre soube que esse era o jornal favorito da Mamãe e que seria espetácular para ela se soubesse que eu estivesse na redação e quem diria agora, a edição.
- Me diga mãe, o que o Papai falava sobre mim para você? Me diga tudo para que eu possa me orientar. Há oito anos que eu não sei o que é viver em família. Preciso entender o que realmente aconteceu!
- Eu também não tive muito diálogo com seu pai. - Ela fez uma pausa longa, me entreolhou e continuou - Seu pai me dizia que você vivia sempre bebado e que saia com uma mulher mais ou menos da minha idade. Disse também que largou a escola no último ano e que não se interessava por nada e nem por mim...
- Filho da mãe. Ele me dizia que você não ligava para mim e que havia tentado matar a Cecília. Alias eu nunca entendi porque a Cecília palpitava tanto na nossa vida, ela...
- Eu os peguei juntos naquele ano! - minha mãe me abraçou de novo. E dessa vez não iria parar de chorar tão rápido. Cecília era a melhor amiga de minha mãe. Como é que eu nunca desconfiei disso? Meu pai é um bastardo que quase destruiu as nossas vidas! E eu também não passo de um garoto mimado que sempre deixa o ceticismo de lado e me conformo com tudo. Alias é só isso que eu tenho feito, me conformar.
- Eu não fazia nem ideia disso mãe, me desculpe se eu nunca me importei. Meu pai fez uma lavagem cerebral em mim e eu só me preocupava com a faculdade...
- Você fez certo filho, investiu em você. Não fez que nem seu pai que largou tudo para ficar aprodecendo junto com aquela fazenda...
- A fazenda! Porque é que vocês nunca se separaram? A fazenda seria sua por direito e...
- Eu não quero aquelas terras! O coração do Tadeu estão nelas, eu só entrei com o capital. Se nos separarmos as chances de seu pai ficarem com elas são mínimas. E sem elas ele não seria nada. Por mais que tudo isso tenha acontecido eu não lhe desejo mal - ela chorava muito e agora já se encontrava aos prantos.
Não me restava dúvidas. Minha mãe ainda o amava. Continuamos conversando por horas e a cada momento eu ia descobrindo o crapula que meu pai realmente era e o anjo de mãe que eu tinha e não valorizava. Decidi dormir por ali e partir assim que amanhacesse. Não me importei de dormir na poltrona do living. Diversas dúvidas e anseios pipocaram por toda noite em minha cabeça. Já não sabia o que eu faria quando eu encontrasse o Papai. O velho Tadeu conseguiu fazer uma reviravolta na minha vida!

2 comentários:

Henrique Donancio disse...

A única certeza de todo ser humano, é que tem uma mãe, e não é por acaso.

Laura Reis disse...

tadinhoo...!

bate no tadeu!

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